Criei esse blog com o intuito de
contar as muitas histórias que passei com meus amigos e de compartilhar
pensamentos, aprendizados e outras experiências de minha vida, de forma
sincera, divertida e engraçada. Porém, esta postagem sairá dessa linha, mas
sempre mantendo a honestidade, como de costume.
Sou Biólogo, e trabalho há três
anos como Licenciador Ambiental em um município gaúcho. A única profissão que
lembro que queria ser desde criança era biólogo. Não perdia uma sexta-feira de
Globo Repórter, quando o programa era sobre “bixos”. Minha mãe me dizia: “Fernando, hoje
o Globo Repórter é de ‘bixo’”. Ela também sempre gostou de natureza. Assim, eu vivia falando por aí
que queria ser biólogo quando crescesse.
Pois bem, cresci (nem tanto, 1,70 m), me
esforcei bastante e me tornei biólogo. Uma coisa que eu sempre digo, é que se eu
tivesse outra profissão faria biologia apenas por hobby, pois eu realmente
gosto do que faço; e dou muita importância, pois a natureza viabiliza
a manutenção da vida na terra à longo prazo.
Depois de formado veio o
desespero, voltei para casa de meus pais e fiquei um ano ajudando no
restaurante deles. Mas sempre pensando em qual seria meu próximo passo. Frustrado por não existir emprego para bacharéis em biologia recém formados e influenciado pelo meu
pai, que vivia me dizendo para fazer concursos, e pelo meu amigo Rodrigo, que
já tinha passado em um concurso na área dele, resolvi começar estudar para concursos.
A primeira dificuldade foi não saber estudar. A segunda foi descobrir que praticamente todos os concursos para biólogo possuem apenas uma vaga. Em um ano prestei sete concursos
públicos. Nos primeiros tive vergonha do resultado. Foi ali que eu vi que tinha
que me dedicar mais. Finalmente
no último concurso fiquei em primeiro lugar.
Menos de dois meses depois recebi
a ligação da prefeitura, me chamando para assumir o cargo.
Então, no dia 14 de fevereiro de
2012 comecei a trabalhar como biólogo em um município gaúcho, no cargo de Licenciador
Ambiental. Fiquei extremamente empolgado, pois poderia fazer o que todos da
minha turma almejavam, que era trabalhar diretamente na defesa do meio
ambiente, na exigência do cumprimento da legislação ambiental, na prevenção da
poluição!
Eu sempre tive aversão à corrupção e desonestidade, então essa era minha outra oportunidade: ser um servidor público honesto e dedicado. Eu poderia enfrentar os canalhas que queriam poluir,
os colegas omissos que apenas queriam ganhar dinheiro e não fazer nada.
Comecei trabalhando com afinco,
dedicação, absorvi todo conhecimento possível e sempre fui o mais competente e
honesto possível.
Porém, meu maior desânimo foi
aprender uma dura lição: no Brasil são as pessoas honestas que são severamente punidas, e não as desonestas!
Para quem não sabe, o Licenciador
Ambiental é responsável pela emissão das licenças ambientais, como Licença
Prévia, Licença de Instalação e Licença de Operação, assim como Alvará
Florestal para poda, abate ou supressão de vegetação. Praticamente toda
atividade econômica precisa de licença ambiental para funcionar ou para ser
implantada. Todas as atividades devem respeitar as normas legais e podem apenas
poluir dentro do legalmente permitido. Caso o empreendedor não cumpra as
exigências do órgão ambiental ele poderá ser autuado ou terá sua licença
ambiental revogada.
A licença ambiental é um pré requisito para
qualquer financiamento, participação de licitação, compra e venda de matéria
prima, de produtos, disposição de resíduos, etc.
Assim, a licença ambiental é um
documento extremamente importante. É normal as empresas terem que se adequar antes de sair a licença ambiental, pois quase todo mundo funciona de forma irregular. Então é preciso investir em equipamentos de controle ambiental e mudar a forma como geralmente os resíduos são gerenciados.
Então, os licenciadores são tidos
como os grandes obstáculos para o enriquecimento e crescimento das empresas...
(fajutas, porque as sérias só se beneficiam com a adequação ambiental).
Sabendo disso é fácil perceber
que uma rotina diária é o prefeito receber reclamações sobre seus licenciadores. Uma vistoria que aponta uma irregularidade é uma afronta à empresa
e à administração, ainda mais se a empresa financiou a campanha do prefeito
atual. Cada exigência que se faz é um empresário em potencial no gabinete do
prefeito, pedindo explicações. Isso é ridículo!
A pressão é muito grande, de
todos os lados. As ameaças constantes. O medo de a administração te colocar
numa fria ou armar uma pra cima de você é constante.
Estas situações são extremamente
estressantes, porém eu nunca deixei de apontar uma irregularidade, de exigir
uma adequação ou de indeferir uma solicitação sem condições mínimas ou de
revogar uma licença quando adequadamente motivada.
Com isso algumas pessoas
aproveitaram a insatisfação da administração em relação à minha pessoa e
trocaram facilidades ambientais por regalias, tipo cursos (com diárias),
participação em comitês (com diárias), recebimento de menor quantidade de
processos e processos mais fáceis, etc. Nada disso me interessa, pois meu
pagamento extra é a satisfação do dever cumprido, do orgulho próprio de nunca ter
mudado uma licença ou um parecer para agradar ninguém.
Muitos colegas de profissão devem
ter feito biologia por desconhecimento sobre a matéria, pois alguns fazem
muito esforço para ganhar dinheiro e pouco se preocupam com o meio ambiente ou
com os princípios constitucionais da administração pública.
Comecei a reclamar do excesso de
trabalho que estava recebendo, dos processos difíceis que estavam me passando,
enquanto muitas pessoas na prefeitura passavam o dia lixando a unha e resolviam problemas particulares, com o
telefone da prefeitura aliás. Eu sabia que essa era a minha punição por ser honesto e
competente. Porém as coisas começaram a piorar ainda mais...
Comecei a ser pressionado para
fingir que não via certas coisas, para emitir licenças em desacordo com as
normas, omitir dados, fatos, ignorar a legislação, “dar uma aliviada”, “dar um
jeitinho”, em certas situações.
Como eu não cedia, começaram a
espalhar boatos a meu respeito, que eu só queria ferrar com a administração,
que eu era da oposição (apesar de nunca ter tido partido).
Todos cochichavam pelas minhas
costas. As pessoas começaram a me tratar diferente.
E o pior: a minha avaliação no
estágio probatório, que sempre tinha nota máxima, condizente com minha dedicação, honestidade e zelo pelo trabalho, agora estava com notas baixas,
apesar de meu trabalho não ter mudado em nada, muito pelo contrário, estava
trabalhando o máximo que podia mesmo sob forte estresse, em um ambiente de
trabalho totalmente tóxico.
A sacanagem que me fizeram na
avaliação do estágio probatório foi a gota d’água.
Como eu gosto muito de ciência,
adoro livros de divulgação científica, aprendi desde muito cedo a ser
intelectualmente honesto. Não roubar a ideia alheia, dizer a verdade, ser
justo. A honestidade intelectual é um valor que me marcou profundamente. Lembro
que a primeira vez que li sobre isso foi no livro do Carl Sagan, Um Mundo
Assombrado Pelos Demônios.
Talvez seja por isso que uma coisa que me
mata por dentro é injustiça e desonestidade. Quando cometeram aquela
injustiça tremenda, e eu não podia fazer nada, aquilo me derrubou. Comecei a
ter dor no peito de estresse, falta de memória, problemas de relacionamento,
irritação constante, falta de apetite, perda de peso, e depois de um tempo
comecei a ter alergia alimentar. Ainda estou fazendo exames para descobrir o
que eu tenho, pois certos alimentos me deixam muito mal.
Muitas coisas aconteceram. No
meio disso tudo uma servidora desiludida da vida, solteirona e triste, com uma
fixação doentia por cães, parou de falar comigo e começou a debochar e me
difamar e injuriar, tudo porque eu “me intrometi no serviço dela”. Passei um
relatório de vistoria de um senhor que havia cortado dois pinheiros gigantes em
cima de um morro, os quais eu havia indeferido a solicitação. Depois de um ano
essa pessoa, que é agente de fiscalização ambiental, autuou o infrator. Porém,
essa história, que deveria ser rotineira em todo departamento de meio ambiente,
serviu para essa pessoa desequilibrada infernizar a minha vida. Passei mais de
um ano ignorando essa pessoa. Porém, cheguei ao meu limite e percebi que
quanto mais eu ignorava mais ela debochava de mim e me perseguia. Como minha
mãe sempre diz: quanto mais você abaixa a cabeça, mais levanta a bunda (para ser
chutada).
Tentei desesperadamente mudar de
sala, para poder trabalhar ao menos, e poder me alimentar melhor, pois o
estresse estava tão grande que eu mal comia. Mas eu, que não “colaborava” com a
administração, nunca iria receber uma ajuda dessas. Eu poderia morrer se fosse
o caso, que a administração nunca iria deixar eu mudar de sala. Eu estava ao
ponto de explodir, disse para todo mundo que se não me autorizassem eu iria me
mudar de qualquer forma, e que eles me mandassem pra rua se quisessem... Porém,
depois de muito custo, muitos e-mails e insistência, um secretário interino,
que estava só de passagem, me autorizou a mudar de sala. No mesmo minuto levei
meu computador e todas as minhas coisas para a outra sala, antes que outras pessoas
ficassem sabendo e me impedissem.
Não gosto nem de lembrar, fiquei
traumatizado com todas essas situações.
Porém, as coisas não mudam tão
fácil. A mesma pressão continua. Ser
honesto neste país é tremendamente difícil, estressante, perigoso, e faz mal
para a saúde.
Mas apesar de tudo eu continuo
aqui, sendo honesto, um pouco irritado com esse país, porém com um
sono tranquilo...
Aconteceu muitas coisas depois disso, que contarei em outra ocasião.
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